terça-feira, 13 de março de 2012

O que significa Roselane como reitora da UFSC?

Análise da Brigada 21 de junho - Brigadas Populares

A Universidade Federal de Santa Catarina passou por uma eleição de reitoria histórica no final do segundo semestre de 2011. Elegemos a professora Roselane Neckel para ser dirigente da UFSC nos próximos 4 anos, resultado que significou a derrota do grupo que governava a UFSC há décadas e a utiliza como um mero balcão de negócios, representado pela candidatura de continuidade: Paraná/Vera Bazzo. No entanto, nem tudo são rosas, a vitória eleitoral representa apenas o primeiro passo para a mudança na maneira fisiológica como funciona o poder na UFSC e, para transformar essa vitória em alterações profundas na estrutura universitária é necessário nesse momento fazer uma avaliação profunda do processo eleitoral e pensar os próximos passos.


É importante, em primeiro lugar, analisar as principais causas da votação da candidatura de Roselane em cada categoria. Entre os professores, muitos dos que estavam decepcionados com a manutenção do balcão de negócios e da incompetência administrativa da atual gestão optaram por um projeto que prometia mais transparência e democracia, mas não representava nenhum perigo aos seus interesses. Desta forma, Roselane obteve 47% dos votos nesta categoria. É importante ressaltar este aspecto porque significa que dentro do grupo que compõe a gestão eleita temos representantes dos setores conservadores dos professores, que certamente serão contrários a mudanças mais profundas na estrutura universitária: mudanças nos currículos, na lógica de produção de pesquisa e extensão na universidade etc.

Nos servidores técnico-administrativos, Roselane obteve apenas 13% dos votos no primeiro turno e chegou a um total de 42% no segundo turno, quase o triplo. Este resultado pode ser quase inteiramente explicado pela transferência de votos da candidatura Irineu/Righi, que fez 30,48% no primeiro turno e possui forte inserção no setor dos servidores insatisfeitos com a política da atual Reitoria. Entretanto, o candidato Paraná obteve 57% dos votos, entre eles os daqueles que sempre se beneficiaram das nomeações de cargos. Esta é certamente a categoria em que a nova Reitora possui mais fragilidade e onde poderá encontrar resistência dos oportunistas que perderam seu espaço. É urgente realizar mudanças na relação entre Reitoria e servidores,  isolando o grupo oportunista desta categoria e debatendo seriamente a implementação de suas pautas históricas, como a jornada de 6 horas de trabalho.

Os estudantes certamente definiram a eleição e seu comportamento merece ser avaliado com muita atenção. Desde o primeiro turno, era a categoria onde a candidatura Paraná apresentava maior fragilidade, apesar de permanecer na liderança com 38% dos votos. Sinal de que os estudantes são o setor mais autônomo da universidade, porque não são facilmente cooptados por cargos e favorecimentos e porque depende dela para obter uma formação de qualidade. O enfrentamento constante do Movimento Estudantil em relação à gestão anterior, especialmente no processo que gerou a ocupação da Reitoria, contribuíram para este resultado. Entretanto, um fator é determinante para que Roselane tenha feito 70% do total de votos no segundo turno, dobrando seus votos e fazendo com que Paraná perdesse votos em relação ao primeiro turno. Trata-se da gravação de uma reunião em que o candidato Paraná negocia favorecimentos com estudantes de seu comitê de campanha, que foi divulgada por um grupo chamado “Operação Navalha“ no segundo turno e acessada por mais de 8000 pessoas em poucos dias. Esta gravação alterou subtancialmente o cenário eleitoral e foi determinante para a vitória, mas não representa de forma alguma acordo com um projeto definido de mudanças na UFSC, além da rejeição natural que todos temos contra práticas corruptas e negociações escusas.

Embora o grupo mais conservador tenha sido derrotado, o resultado das eleições – nas três categorias – expressa muito pouco a vitória de um projeto definido para a universidade, além da negação à gestão anterior. Por isso, a maioria das  propostas se limitam a melhoras na gestão, a partir da nomeação de cargos por competência e não por acordos eleitorais, ou então de democratizar as decisões. Se a falta de um projeto claro agregou diversos setores com projetos diferentes e foi certamente essencial para a vitória eleitoral, é necessário reconhecer que muitos dos defensores da atual estrutura universitária – que criticam apenas a corrupção e má administração anteriores – fazem parte do grupo eleito para dirigir a universidade e tentarão atravancar as propostas mais avançadas.
O primeiro momento de disputa da próxima gestão são os Fóruns, proposta central da campanha, e que terão a tarefa de democratizar as decisões. Há duas opções: a primeira é os fóruns acontecerem em breve, com uma divulgação massiva e poder real de decisão. Ou seja, para ser instrumentos de democratização, os fóruns devem ter caráter deliberativo ou, ao menos, um caráter vinculante, na medida em que Reitora se comprometa a vincular e incorporar as reivindicações e diretrizes discutidas em sua gestão.

A segunda proposta, que será defendida pelos setores mais conservadores da gestão, é que os fóruns sejam enxutos, esvaziados e sem poder de decisão alguma. Neste caso, o mais provável é que ocorra uma grande ouvidoria da UFSC, em que todos os presentes irão falar o que pensam, sem definir as linhas políticas que a universidade irá seguir. Haverá apenas uma maquiagem democrática para a Reitoria, como ocorre em conferências realizadas pela Governo Federal ou mesmo em consultas realizadas pelo prefeito de Florianópolis, Dário Berger. Este mesmo setor, irá tentar adiar ao máximo a realização destes espaços para dar centralidade à equipe de transição (que é um espaço fechado) na definição das linhas políticas da próxima gestão.

Por fim, embora a vitória da Roselane – que ajudamos a construir – represente mudanças na estrutura de poder em nossa universidade, ainda não temos nenhum avanço concreto garantido, e sim melhores possibilidades de disputa. Nesta situação, o Movimento Estudantil não pode alterar sua dinâmica para blindar a nova gestão, evitando fazer críticas a ela. Erro maior ainda é tornar-se parte da gestão, ajudá-la a administrar a universidade e disputá-la internamente.

Historicamente, os estudantes são o setor mais capacitado para a disputa de uma universidade necessária à resolução dos problemas nacionais, que repense sua relação com a sociedade, os currículos e os profissionais que forma, sua política de pesquisa, de extensão, de cultura, de assistência estudantil. Nossa única força para tal tarefa é nossa capacidade de mobilização e radicalização das pautas. É apenas com independência política, radicalidade programática e movimentação de massas que poderemos impulsionar avanços estruturais na nossa universidade. Caso contrário, perderemos nossa capacidade de disputa e a nova Reitora será cada vez mais forçada a ceder para os setores conservadores que também a elegeram e que certamente defenderão seus interesses.

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